Qualidade de código e o developer Chaplin

Como desenvolvedores de software, estamos na maior parte do tempo preocupados em estudar técnicas de refatoração, modelos de escalabilidade, padrões de implementação (design patterns) e coisas relacionadas a qualidade de código.

Todo business hoje em dia tem a tecnologia como um aspecto chave. Sendo assim, muito se investe em equipes de desenvolvimento de software, especialistas, infraestrutura e etc. No fim das contas, o que justifica todo essa gasto com tecnologia? Ferramentas de integração continua, code linters, horas/dias de refatoração, o que toda essa preocupação com a qualidade do código tem a ver com a evolução de um negócio?

Qualidade de Código e Objetivos de Negócio

Muitas empresas hoje resignificam o papel do developer, enxergando developers como o que chamam de Software Craftsman. A abordagem basicamente dá mais relevância ao ponto de vista da equipe de desenvolvimento em relação a aspectos de negócio, logicamente isso vem com uma maior responsabilidade.

É responsabilidade do time de desenvolvimento informar ao business sobre os benefícios de se manter a qualidade do código, bem como justificar investimentos em “Engineering Resources”, saber negociar novos prazos, necessidades de novas contratações e etc.

Toda decisão do time técnico deve ser justificada com um business output (resultado de negócio tangível). Manter uma codebase de qualidade por exemplo, te permite principalmente:

Repare: todos os itens mencionados acima são benefícios de negócio. Desenvolvedores já sabem que torná-los realidade é possível, ás vezes não sabem é associá-los ao contexto de negócio em que estão inseridos (problema grave).

Como bem diz Victor Wu Product Manager do Gitlab, “Engineering Goals Are Business Goals”. Particularmente, concordo 100%. Empresas investem em tecnologia para tornar negócios economicamente viáveis, qualquer esforço por parte da equipe de desenvolvimento que não leve à melhores resultados de negócio, é essencialmente perda de tempo.

Negligência pela Sobrevivência

Falando de empresas maturas entregando produtos bem estabelecidos, é bem improvável que o mercado receba de bom grado grandes mudanças em seus produtos, principalmente se forem mudanças que afetam core features. O caso é que em empresas desse tipo, há uma maior exigência pela preocupação com performance, segurança e privacidade, o que torna praticamente impossível abrir mão de esforços para manter a qualidade do código.

Sendo assim, faz sentido abrir mão da qualidade do código? Ás vezes sim.

Em pequenas startups ou grandes empresas lançando produtos rapidamente para competir, eu diria que essas não só podem negligenciar a qualidade do código, como na maioria dos casos devem. Desenvolvedores podem não gostar de ler isso, mas é o retrato do conceito de Débito Técnico. Em momentos específicos faz sentido pra uma startup estrategicamente assumir uma série de débitos técnicos, a fim de lançar um produto ou uma nova feature rapidamente para ganhar em timing.

Se ao invés disso você escolhe ter 100% de cobertura em testes unitários e refatorar seu código toda vez que encontrar um code smell, provavelmente perderá boas oportunidades e em 3 meses ainda não terá um negócio com seu produto rodando, experiência própria. Como qualquer negócio saudável que no futuro atinge seu payback e paga suas dívidas, haverá tempo para colocar os débitos técnicos em dia, a fim de não ter uma codebase de má qualidade desacelerando o negócio.

Problemas imaginários

Defendo que manter a qualidade do código é regra, com exceções. O ponto aqui é que há muito o que fazer para aumentar as chances de sobrevivência de um negócio para se preocupar com a qualidade do código em cenários early stage. Então seja numa nova empresa ou novo produto, a negligência ponderada aqui não faz mal, se faz necessária.

Developers developers, negócios à parte?

Ainda existem desenvolvedores que se incomodam em participar ativamente de decisões de negócio. Pra muita gente, é confortável simplesmente “apertar parafusos” (exatamente como em Tempos Modernos, filme de Chaplin) e seguir com a mentalidade de que desenvolvedor não tem nada a ver com business.

É necessário articular com o business, negociar, defender pontos de vista sob uma perspectiva técnica para que decisões de negócio sejam bem tomadas. A balança do que pode ou não virar um débito técnico é delicada e possui nuances técnicas que o time (obviamente) deve apresentar, sugerir opções e fazer recomendações.